Tempo de arrependimento e perdão como na Eira de Araúna



Wilma Rejane

O relato sobre a Eira de Araúna está presente em dois livros da Bíblia: II Samuel 24 (escrito por profeta Samuel)  e  I Crônicas 21 ( escrito por Esdras) . Os dois relatos trazem algumas diferenças, por exemplo: através de Samuel, toma-se conhecimento que a eira em questão pertence a Araúna. A mesma eira é descrita por Esdras como pertencente a Ornã. Araúna e Ornã são a mesma pessoa? Na teologia brasileira, os diferentes nomes definem a mesma pessoa. Existe, porém, uma publicação chamada “The New Man” de Thomas Merton  que considera Ornã e Araúna pessoas distintas, os dois seriam irmãos. O detalhe de identidade, contudo, não prejudica a história. 

A eira emerge na bíblia em uma situação um tanto delicada: Rei Davi havia feito um censo (numeração de povos) e, por este motivo, Deus estava descontente, irado. Todas as vezes que um censo é citado na Bíblia, a citação vem acompanhada da lembrança de que Deus é quem ordena a numeração, vide:

Como o Senhor ordenara a Moisés, assim  numerou os filhos de Israel no deserto de Sinai.” Números 1: 19

“Depois da praga, o Senhor disse a Moisés e a Eleazar, filho do sacerdote Arão:  façam um recenseamento de toda a comunidade de Israel, segundo as suas famílias; contem todos os de vinte anos para cima que possam servir no exército de Israel”. Números 26: 1,3

Portanto, um censo, embora sendo responsabilidade do Estado naquela época, era consequência de uma determinação Divina. O censo tinha como principais finalidades:


  • Verificar possíveis fontes de renda por impostos
  • Determinar o tamanho potencial de uma força armada.
Davi, contudo, resolve recensear a população por determinação própria e tentação de Satanás.Provavelmente, o rei estivesse orgulhoso de seu exército, de sua função.  E a população, por sua vez, estivesse agindo de modo semelhante, sem lembrar de Deus. As duas possibilidades são plausíveis, uma vez que, segundo o relato, o censo provocou a insatisfação de Deus com Davi e com o povo. A consequência do pecado do censo, então, recaí sobre o rei e seus súditos. Deus envia uma peste que dizima grande parte da população (II Samuel 24:15).

E nesse contexto Davi se arrepende profundamente de ter agido inconsequentemente e também sofre intensamente a morte de alguns dentre o povo.  Um anjo de Deus é visto sobrevoando a eira  de Araúna. Era o anjo do juízo, o que disseminava a peste.

“ E o anjo do Senhor estava junto a eira de Araúna, o jebuseu”  ( II Samuel 24:16).

A Eira

A eira de Araúna, onde os bois malhavam grande quantidade de trigo, ficava exatamente no monte Moriá, o lugar onde Abraão levou seu filho Isaac para ser ofertado a Deus. 

Deus ordena a Davi que construa um altar em Araúna, um lugar de sacrifícios e intercessão em favor de Israel. E Davi obedece. Compra a eira e prepara caminho para que Salomão construa ali um grande templo ( I Crônicas 3:1)

O templo foi erguido por Salomão e destruído pelos babilônios em 586 a.C. Foi reconstruída sob a liderança de Josué e Zorobabel após o retorno do exílio babilônico (520-516 a.C). Herodes, o Grande, basicamente, construiu um novo templo durante o seu reinado.

Os romanos destruíram Jerusalém, incluindo o templo, em AD 70. Séculos mais tarde, entre 687 e 691, o Qubbet es Sakhra, (Domo da Rocha) foi construído sob as ordens do califa Ommayad, Abd el Malik. O edifício foi restaurado várias vezes, mas o monumento tem preservado suas proporções majestosas originais e design harmonioso. Portanto, o que era a eira de Araúna antigamente, tornou-se alvo de disputas durante os séculos e atualmente abriga uma mesquita muçulmana. 

Diante do expresso sobre a Eira de Araúna, surgem algumas considerações:

I – A eira torna-se uma referência nacional em termos de lugar de culto e oração.
II- Deus escolheu a eira para o encontro entre: Davi , a família de Araúna,  os soldados do rei e a visão do anjo.
III- Araúna quer doar a eira gratuitamente a Davi, pois, vê o anjo no lugar e entende que o próprio Deus está dando-lhe um sinal de consentimento.
IV- Davi não aceita doação da eira,  ao invés disso, paga uma quantia que considera justa para adquirir o local.
V- Davi havia se arrependido bem antes de construir o altar na eira e oferecer sacrifícios em favor do povo.
VI- A eira era um lugar de separação de trigo
VII- Era um lugar onde uma família trabalhava unida, dia e noite em prol de gerar alimento e renda em Israel.

Lições práticas sobre a eira de Araúna:

Apesar do local físico e geográfico da eira de Araúna ter certa importância na história antiga, atual e vindoura de Israel, o que pretendo tratar aqui é sobre o aspecto espiritual que envolve a eira.

Na eira, a presença de Deus se manifesta tanto em justiça quanto em misericórdia.  Da mesma forma que o trigo era malhado ali, dia e noite, em todo um processo  de seleção e melhoramento, assim também aconteceu com as pessoas envolvidas na narrativa Bíblica da eira.

Davi entristece a Deus e ao retomar a consciência de pecado, se arrepende, sofre, e busca a face de Deus: “Então Davi reconheceu seu erro e confessou a Deus: Pequei gravemente com a minha atitude. Agora, pois, eu te imploro que perdoes o pecado do teu servo, porquanto cometi uma grande loucura!” I Crônicas 21:8

A eira, assim, torna-se um lugar de arrependimento e oferta. Ali Araúna quis ofertar seu melhor para Deus. Aquela propriedade muito lhe custara, dali vinha seu sustento. Araúna, contudo,  foi abalado pela presença gloriosa de Deus manifesta no anjo da morte. Uma morte que não representou um fim, mas um meio pelo qual Deus revelou Sua graça e misericórdia. Araúna não estaria sendo marcada pelo luto, mas pela restituição da vida. Construir o templo ali só foi possível porque Araúna abriu mão da bem-sucedida propriedade,  em detrimento de algo que julgou muito maior: servir a Deus.

E naquela mesma eira, décadas antes, mais uma vez, a presença gloriosa de Deus, manifesta no anjo da vida, restituíra  a alegria e a provisão para Abraão.

“E chamou Abraão o nome daquele lugar: o Senhor proverá; donde se diz até ao dia de hoje: No monte do Senhor se proverá.” Gênesis 22: 14

A espiritualidade na eira de Araúna é um misto de presença residente de Deus e santidade separadora. O templo construído ali por Salomão representava uma transição, pois o lugar terreno, nada mais era do que um sinal do templo eterno de Deus. O templo foi abalado por diversos conflitos, atualmente está sob domínio muçulmano, porém Deus se fez homem, habitou entre nós, para nos tornar templos de Seu Espírito, eternizados de uma vez por todas para viver a santidade e a proximidade com Ele (I Coríntios 6:2)

Os números

A ira de Deus  em Araúna se deu por ocasião do censo, uma circunstância numérica e desprovida de santidade. Mas, não deveria ter sido assim, pois, o censo em Israel, até então, era muito mais que mera contagem motivada por orgulho de governantes. 

Êxodo  mostra de que maneira o censo deveria ocorrer.:

“Falou mais o Senhor a Moisés dizendo: Quando fizeres a contagem dos filhos de Israel, conforme a sua soma, cada um deles dará ao Senhor o resgate da sua alma, quando os contares; para que não haja entre eles praga alguma, quando os contares. ”Êxodo 30:11,12 

Ou seja: estava claro que todas as almas envolvidas no censo eram propriedades de Deus. Por este motivo, concomitante a contagem, havia  culto a Deus, oferta. Davi não cumpriu os trâmites espirituais do censo, por isso, a peste assolou a população. Naquele período da vida de Davi, ele pecou por não creditar a Deus o seu Reino, a força militar e a expansão de seu território.

Aprendamos com o erro de Davi: honra e glória sejam dadas a Deus, todos os dias, pois Dele vem a vida e o sustento. Aos líderes ministeriais também cabe uma lição indispensável: não vos preocupeis com os números, antes, valorizem a qualidade do culto, a espiritualidade saudável que glorifica a Deus e não a que reforça o orgulho e a vaidade.

A transformação da eira em templo foi um marco na história de israel. Um memorial da bondade de Deus que perdoa  pecadores e restituí a alegria da salvação. Um memorial de soberania; Deus tem a conta de cada habitante da terra e conhece o que se passa no coração de cada homem. 

Atualmente, sob o símbolo na Nova e eterna Aliança entre Deus e o homem, temos a Cristo Jesus. Através Dele recebemos remissão dos pecados e salvação completa. A era de Cristo se findará com a separação entre joio e trigo, tal qual se fazia na eira de Araúna (Mateus 13:24-30). Por isso o tempo de arrepender-se é hoje. O tempo de abrandar a ira de Deus sobre o pecado, é hoje.  Refugiemo-nos na eira, ofertemo-nos a Deus na eira, confiantes de Sua provisão hoje e sempre.

Deus  nos abençoe.

Fontes:

BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudo Plenitude, Tradução João Ferreira de Almeida, São Paulo, Sociedade Bíblica do Brasil, 1995.

O Oriente Médio, Hachette, 1966.



8 comentários:

Ministério Sidnei Vivente disse...

Irmã Vilma, que estudo lindo e muito bem elaborado, sempre como Pastor tenho alimentado o meu coração, com as vossas postagens edificantes e que muito inspiram e alimentam os meus sermões.

Que o Eterno continue lhes abençoando assim.
Pr Sidnei Vicente

Unknown disse...

Muito forte este estudo e sermão. DEUS LHE ABENÇOE. ...

Anônimo disse...

Parabéns pela profundidade na interpretação do texto. Uma grande revelação da parte do Senhor. Deus continue te usando poderosamente.
Pr. Bruno Casini

Unknown disse...

Excelente!!!!

Unknown disse...

Muito esclarecedor,esse estudo, Deus seja louvado.Gratidão

Sivirino Vicente disse...

Prezados a Paz de nosso Senhor e Salvador Jesus.

Parabéns por este estudo muito abençoado.

Me perdoem somente por esta observação: O escritor do Livro de 2 Samuel não foi Samuel, pois o mesmo já havia falecido: 1 Samuel 25:1.

Sivirino Vicente disse...

Parabéns pelo estudo, muito bom.

Me perdoem, mas gostaria de fazer somente um comentário: Na verdade não foi Samuel que escreveu o livro de 2 Samuel, pois ele já havia morrido.
Fiquem na paz.

Unknown disse...

Pr Edson,como me edificou espiritualmente este estudo,graças a Deus por levantar homens e mulheres alicerçados na palavra.